Hoje o tempo voa. Bate asas tão
aleatoriamente que muitas vezes nem avistamos o horizonte em seu perfeito
declínio. Embora o conhecimento humano já tenha capacidade suficiente para
declarar que nenhum ser vivi infinitamente, a sociedade atual está transbordando
minutos. Cada sorriso possui seus milésimos e segundos acumulados no interior
para serem desperdiçados. É como se cada momento perdido fosse uma pressão impiedosa
de nossos relógios para com nossas vidas que tão sutis celebramos.
Um minuto a menos, outro a
menos, e outro, e outro, e outro...
O encantamento do homem pelo
prazer do viver se torna superior àquela capacidade de compreender que a
eternidade nunca será presenciada por alguém. Sabemos que ela existe neste
mundo de hipocrisia e perdão, mas nunca teremos a habilidade - se é que isso é
algo digno de talento - de enxergar o fim deste desejo jamais anulado, até
porque a eternidade é eterna e assim será para sempre. Você entende a maestria
da eternização.
São os infinitos que amedrontam
as ambiguidades da vida. Esta é a polêmica indefinida do infinito do amor. Pois
o mesmo é mais forte que o infinito dos números. O mesmo segue seu contínuo
sentimento. O mesmo apenas acontece: amamos e somos amados, às vezes
infinitamente. Sentimentalismo talvez seja isso: um infinito desconhecido sem
um pingo de razão. A infinidade numérica, repleta de motivos, é um amontoado de
algarismos que se seguem porque possuem uma ordem, uma padronização matemática,
um eixo que se desencadeia do menor ao maior, do zero ao infinito que se queira
chegar. Da onde vem o infinito metafórico? Provavelmente da não compreensão, do
desconhecimento, do rancor guardado ou da paixão engolida a seco. É através do
sofrimento que a saudade nos habita e do amor que nos alucina.
Veia que deseja ou sangue que
pulsa? Talvez seja ao contrário, mas para algumas pessoas a ordem não importa.
Porque assim que funciona o sentimento em terra firme: nem os fins e nem os
meios são indispensáveis quando a finitude nos atinge. Quando perdemos aqueles
que deram e dariam de tudo para que a infinidade da relação fosse estabilizada
e nunca mais danificada por ninguém, nem pelos deuses ditos lá em cima. Camões
já dizia que o amor ardia como fogo e a cegueira nos era imposta para que o
incêndio queimasse a pele, tão peculiar e tão insensível como uma ferida que
dói e não se sente. E o quão destruidor é não ouvir a sinfonia da voz daqueles
que partem para a constelação acima de nós? Não refletir os olhos na pupila que
transparece a esperança e os motivos? É temer a felicidade que resulta da
angústia de continuar a vida. E nós vamos rindo das meticulosidades temporárias
da graça de viver. Mas haverá sempre o momento final de cada gargalhada e de
cada escalada ao topo do mundo onde perceberemos que eternizar um sorriso é
muito mais abrir mão da realidade do que abraçar a insanidade.
O tempo? Implacável. Afasta
corpos e almas. Afasta aqueles com quem aprendemos a lutar e a retirar de
qualquer dicionário próprio a palavra desistir.
Dias passam a não ser mais dias, porque manhãs passam a ser uma única noite. É
a lição que nem ele, o tempo, consegue concretizar no livro de aprendizados
humanos. É o vazio irreparável que eterniza a concepção: a vida é uma questão
de laços invisíveis e eternos em qualquer dimensão.
Contudo, acredito que o
principal conceito para você seja a falha humana. O que poucos sabem e muitos
ignoram é a capacidade incrível do ser humano de prometer falhar. Prometer
errar constantemente e dedicar parte das 24 horas diárias à imperfeição. A
humildade ultrapassa a capacidade de qualquer texto ou conjunto de palavras sem
coerência, porque mostra aquele que sempre está disposto a aperfeiçoar. Saber
que nada se sabe – frase essencial na contemporaneidade brasileira – é também
um artifício para a evolução. O medo, por sua vez, não é admitir. É assumir
muitos esquecimentos e jamais enterrá-los junto aos fracassos. Obrigada por me
ensinar isso.
À eterna professora, mãe, amiga
e inspiração. Acima de quaisquer palavras de saudade e necessidade está a
gratidão. Maria da língua castelhana e do abraço inesquecível. O pudor humano
revela o verdadeiro caráter da lamentação humana quanto ao tempo e às oportunidades
perdidas ou às palavras não ditas. Se o tempo hoje realmente voa e bate asas,
onde está a crença fiel da eternidade de alguns sentimentos? A resposta é
irrelevante em palavras e muito significativa quando sentida, porque você me deu
uma aula sobre como eu sempre serei eu mesma à medida que não sou a mesma
quando outro minuto passa. Pequenas coisas e pequenos infinitos que jamais
esqueceremos.
Tempo irreparável de coisas
boas e coisas ruins. Isso também é eterno.
À minha eterna Maria.
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